Resenha: Orgulho e Preconceito

Imagem: Reprodução/Filme Orgulho e Preconceito
"É verdade universalmente reconhecida que um homem solteiro, em posse de boa fortuna, deve estar necessitado de esposa" (Página 1)
Com esta máxima que tornou-se clássica e foi reproduzida em diversas adaptações
cinematográficas, a célebre obra de Jane Austen, Orgulho e Preconceito é considerada
até hoje um de seus melhores romances por conta da originalidade e do humor crítico.
O enredo traz como protagonista a segunda das 5 filhas do casal Bennet, a jovem
Elizabeth, que com sua personalidade forte, impressiona por seu senso crítico e inteligência
vivaz. Sua mãe, uma casamenteira incorrigível, dedica-se a uma missão quase sagrada:
casar suas filhas com homens ricos e bem-sucedidos antes que todas terminem solteiras e
dependentes da família.
Naquela época, a regra geral para unir duas pessoas em matrimônio não era o amor e sim
os interesses em comum de ambas as famílias, isto é, um contrato social que visava lucros
bilaterais. Mas na contramão dessa lógica, Lizzie sonha com uma relação verdadeira e
romântica e por isso não se interessa por nenhum pretendente, embora já tenha debutado
na sociedade.
Sir Bennet, seu pai e o mais parecido com ela, prefere não se interpor e apenas permite que
sua mulher ocupe-se com sua obsessão por casamentos, porém, inevitavelmente ele é
obrigado a colaborar, já que como chefe da casa é o responsável pelo futuro de suas
meninas e precisa achar um bom partido para elas.
Jane, a mais velha e dona de uma beleza singular, é a preferida da Sra. Bennet e quando a
jovem atrai os olhares de Mr. Bingley, um rico aristocrata que chega com sua irmã Caroline
e seu amigo Mr. Darcy para alugar a propriedade em Netherfield, toda a família fica
entusiasmada com um possível enlace entre as famílias.
Por outro lado, Lizzie, apesar de feliz pela irmã, não se deixa enganar pela aparente
amabilidade de Caroline Bingley e percebe não somente na dama mas em seu amigo, o
esnobe Mr. Darcy, um misto de altivez com orgulho, o que a faz antipatizar-se com ele e
confronta-lo assim que o conhece. Entretanto, o cavalheiro não deixa por menos e "fere"
seu ego ao classifica-la apenas como tolerável, mas "não bonita o bastante para me tentar"
(Pág. 26).
A aversão entre ambos cresce cada vez mais e torna-se uma muralha construída por maus
entendidos e intrigas de terceiros, principalmente quando Lizzie se aproxima de Mr.
Wickham, um oficial do exército, e descobre um segredo sombrio de Mr. Darcy, que a faz
julga-lo ainda mais desprezível e suspeitar que ele seja o responsável pelo afastamento
entre sua irmã e Mr. Bingley. Diante dos conflitos que se seguem e das contrariedades
acirradas, somente o amor, surgido aos poucos e fortalecido com o tempo, pode ser capaz
de uni-los e desfazer os obstáculos que ergueram contra si mesmos.
Análise da Narrativa:
Escrita há dois séculos, a trama de Jane Austen foge dos padrões românticos das obras de
sua época ao construir dois protagonistas diferentes e quase irreconciliáveis, mas que
vivem um romance por amor e não por mero arranjo social. Isso porque ela pretendia
criticar por meio de seus personagens, a sociedade inglesa e seus interesses meramente
arrivistas por trás do casamento, que colocavam uma pressão arbitrária e egoísta sobre as
mulheres.
Curiosamente, Jane Austen jamais se casou e suspeita-se que tenha sido após uma
decepção amorosa que sofrera na juventude, porém nada disso a impediu de escrever com
maestria sobre um tema que até hoje encanta e ganha espaço na literatura e no cinema.
Além disso, sua forma perspicaz de pensar, assemelha-se muito com a de sua protagonista,
o que pode explicar as características psicológicas da heroína e seu pensamento fora dos
padrões conservadores de sua realidade.
Ao se conhecerem no baile de Meryton, Lizzie e Darcy não se apaixonam à primeira vista,
ao contrário de Jane e Mr. Bingley, e o que mais chama a atenção na narrativa é a maneira
realista com que Jane Austen trabalhou os personagens, destacando inicialmente seus
defeitos e depois lentamente as suas qualidades, ao conseguir em uma virada avassaladora
tornar o arrogante e presunçoso protagonista em um herói digno do amor e do perdão da
amada.
Como a história se concentra a partir da perspectiva de Lizzie, fica impossível não
concordar com sua aversão a Mr. Darcy, pois de fato ele se comporta com vaidade e
orgulho ao deprecia-la e depois tomar atitudes moralmente questionáveis, que geram
consequências profundas em duas pessoas inocentes. Entretanto, quando ocorre um
escândalo que ameaça arruinar os Bennet, o socorro vem de quem a família menos espera
e muda totalmente os rumos de um destino que parecia inevitável, inclusive para a própria
Lizzie.
Muitos críticos literários consideram como fator determinante para o sucesso do romance, a
própria antítese do título, que define muito bem as impressões que cada personagem tem
sobre o outro e a discussão que se faz sobre seus valores e o papel familiar nesse
processo. Mas além das qualidades técnicas apontadas pelos estudiosos, outros motivos
para o êxito dessa obra bicentenária com certeza são: as críticas sociais, o romance sem
clichês, a escrita detalhada e profunda, a protagonista questionadora e atual e, por último, o
herói, que com seu caráter forte e coração sensível, tornou-se um ícone singular atemporal.
Nota: 10
"Em vão tenho lutado comigo mesmo, nada consegui. Meus sentimentos não podem ser
reprimidos e preciso que me permita dizer-lhe que eu a admiro e amo ardentemente” - Mr.
Darcy
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